Da saída da mesa e da maneira de servir e limpar a mesa.

AS REGRAS DE CORTESIA
SEGUNDA PARTE
Da cortesia nas ações comuns e ordinárias

CAPÍTULO IV.

Da alimentação
ARTIGO X

Da saída da mesa e da maneira de servir e limpar a mesa.

Não se deve esperar até que se tenha o estômago repleto das iguarias para parar de comer; e, como a honestidade requer que se coma com moderação, também requer que não se coma até ficar

totalmente farto.

As crianças sempre devem sair da mesa por primeiro descobrindo-se e fazendo a reverência.

Quando alguém está obrigado a se levantar e a sair da mesa antes dos outros, só deve fazê-lo de cabeça descoberta; e caso for um dependente ou empregado, não deve sair sem antes tira pessoalmente ou fazer tirar por alguém seu prato, cujo objeto não é

honesto.

Se acontecer que alguma pessoa à qual se deve ter consideração estar comendo, e ainda permanecer à mesa no fim da refeição, e se outra pessoa esteja sozinha com essa pessoa à qual deva ou possa ter consideração, particularmente se não for dependente dela, nem seu empregado, esta segunda pessoa, por cortesia, deve permanecer à mesa, para fazer companhia à primeira até que ela se levante.

Os que servem à mesa devem ter as mãos muito bem limpas e sempre estar de cabeça descoberta. O que eles têm a fazer é estender corretamente a toalha sobre a mesa, colocar em cima dela a saleira e depois colocar os pratos sobre os quais colocarão o pão delicadamente coberto pelo guardanapo; a não ser que se esteja

servindo tigelas para a sopa, porque então se devem colocar as tigelas nos pratos e ao lado a faca, a colher e o garfo à direita em baixo do pão e o guardanapo por cima.

Depois devem-se lavar os copos e colocá-los no bufê ou numa mesinha coberta por um pano branco de tal maneira que não possam ser removidos facilmente.

Quando for a hora de servir, sempre se deve ter o cuidado para que tudo o que for necessário, como o sal, o pão e os pratos para servir o pão, estejam sobre a mesa ou sobre o bufê bem limpos e bem arrumados.

Em seguida se deve oferecer para lavar, erguendo um pouco o jarro com cerimônia, segurando a toalha dobrada no sentido longitudinal sobre o ombro esquerdo e mantendo a bacia por baixo, descansando

sobre o braço esquerdo, exceto se já estiver sobre alguma coisa. É sobre as mãos da pessoa mais importante do grupo que se deve começar a deitar a água. Depois deve-se derramar sobre as mãos dos outros, de acordo com a posição e a qualidade de cada um, e algumas vezes sem ordem nem distinção entre elas, o que sempre se deve fazer quando as pessoas não são de qualidade muito distinta.

Um dos primeiros cuidados que se deve ter quando se serve à mesa é enxugar bem os pratos por baixo, particularmente o de soa, para que não sujem a toalha, e colocá-los de tal maneira que cada um possa facilmente colocar neles a colher ou o garfo quando tiverem necessidade.

O pão sempre deve ser servido num prato ou sobre um guardanapo, se não houver prato limpo sobre o bufê; e nunca se deve trazer na mão, nem servi-lo do lado da pessoa mais importante.

Os que servem devem sempre estar prontos a servir o que se pedir, e por isso devem ter sempre os olhos sobre a mesa e não se afastar dela.

Para servir à mesa deve-se estar descoberto e se deve sê-lo especialmente para servir a bebida. E quando se serve a bebida a alguém, deve-se segurar o cálice pelo pé com a mão esquerda, a xícara pela alça e não na palma da mão, ou tocando a borda com os

dedos. Também sempre é preciso colocar vinho no copo antes de o apresentar e depois de o ter apresentado, como se o beijasse, deitar lentamente a água com uma galheta ou o jarro que se deve segurar

na mão direita, e não parar de deitar água até que a pessoa que quer beber erga o copo para dar sinal que não deseja mais.

A cortesia requer que não se sirva bebida a ninguém antes de ter comido por algum tempo dos pratos, depois que a sopa tiver sido retirada. Quer também que se comece sempre a servir a bebida à

pessoa mais graduada do grupo. Também se deve servir sempre a bebida ao lado da pessoa a quem se serve, contudo, se houver várias pessoas à mesa não se deve apresentar nada ao lado da pessoa mais graduada, exceto se absolutamente não se puder fazer de modo diferente.

Quando ao servir o vinho se deitou demais no cálice, não se deve deitar de volta na jarra ou na garrafa, e sim num outro cálice. E, se, pelo contrário, não se tivesse servido suficiente, deve-se deitar mais

tanto quanto quem serve desejar.

Quando se serve bebida a alguém fora das refeições, depois de lhe ter entregue o cálice, deve-se segurar sob um guardanapo um prato para impedir que alguma gota caia na roupa; e depois que tiver bebido, será preciso receber dele o cálice, com gesto de beijo e

ao mesmo tempo apresentar-lhe um guardanapo dobrado para passar na boca; coloca-se também um prato limpo sob o cálice quando as pessoas de alta categoria bebem durante as refeições.

As pessoas que desejam comer de maneira limpa trocam os pratos pelo menos duas vezes durante o almoço: uma vez depois da sopa e uma segunda vez para a sobremesa. Nas casas de gente de alta categoria e nos banquetes, ordinariamente trocam-se todos os

pratos em cada serviço e sempre há pratos limpos no bufê para fazer a troca dos que têm necessidade.

Também é bom trocá-lo quando se tem o prato cheio demais.

Os que servem e trocam os pratos devem começar sua tarefa pela pessoa mais graduada do grupo e fazê-lo com todos em seguida, entregando a cada um um prato limpo à medida que tiverem retirado os outros da mesa.

Quando se está à mesa, deve-se guardar uma grande reserva e não lançar fixamente o olhar sobre os que estão comendo, nem sobre as iguarias. Também se deve ter cuidado que não falte nada aos que estão à mesa, que não estejam obrigados a pedir várias vezes a

beber. Por isso os que servem devem estar muito atentos para examinar se nada falte a alguém e ser rápidos em servir.

É contrário à boa educação retirar os pratos enquanto ainda alguém está comendo. Deve-se aguardar que se faça sinal para os retirar, quer afastando-os, quer de qualquer outra maneira. Também

nunca se deve tirar algum prato antes de colocar um outro no lugar, porque não assenta bem que a mesa fique vazia, a não ser no fim da refeição.

Também não se deve empilhar os pratos para os carregar mais facilmente, especialmente quando ainda há alguma comida dentro deles e quando não estão completamente vazios. Também não se deve juntar num prato o que poderia ter ficado em alguns, para

poder levar tudo de uma vez; mas é preciso levantar os pratos todos um depois do outro, de maneira que só se carregue mais do que dois de uma vez.

Quando se retiram os pratos de cima da mesa, sempre se deve começar com os que estão diante da pessoa mais importante do grupo e começar também por ela a tirar os pratos que se devem trocar assim que a comida tiver sido tirada.

Somente depois da oração de ação graças e é que se deve tirar tudo da mesa. E quando se toma a sobremesa, convém colocar as facas e os garfos e colheres numa cestinha, bem como os pedaços de pão

que tenham sobrado. É uma vergonha resguardar então comida, vinho ou outra coisa para o comer às escondidas.

O sal se tira em último lugar, e depois de ter tirado a toalha deve-se cobrir a mesa com alguma tapeçaria, exceto se ao mesmo tempo se deve retirar também a mesa.

Depois que tudo tiver sido retirado ter-se-á cuidado de varrer cuidadosamente as migalhas e outras coisas que tiverem caído da mesa; em seguida se arruma o fogo, se for inverno, e todos se retiram com uma reverência.

Quem tiver o encargo de acompanhar as pessoas com a vela para as conduzir não levará somente a vela mas a vela com o candelabro, que carregará com a mão direita segurando o chapéu com a

esquerda e iluminando as pessoas enquanto caminha à frente delas.

É uma grande falta de educação apagar a vela na presença das pessoas. A boa educação pede que nunca se faça isso na presença e à vista dos outros, e deve-se ter cuidado que a vela não solte fumaça.

Ainda mais descortês é espevitar a vela com os dedos; sempre se deve fazê-lo com a espevitadeira retirando a vela de cima da mesa.

   São João Batista de La Salle (1651-1719)