SEGUNDA PARTE
Da cortesia nas ações comuns e ordinárias
CAPÍTULO III
Do Vestuário
ARTIGO V
Da espada, da baguete, da bengala e do bastão.
Assenta muito mal e é completamente contra a ordem de uma polícia bem organizada que um burguês carregue uma
espada, a menos que esteja em viagem ou no campo. Contudo uma criança pode carregá-la caso for de classe nobre.
É falta de cortesia revirar o talabarte da espada diante de si, e mais ainda colocar sua espada entre as pernas.
Não se deve manter a mão sobre o copo da espada quando se fala a alguém ou em passeio; basta colocar ali a mão quando se está obrigado a puxar a espada.
Por mais generoso que possa parecer quem sempre está pronto para desembainhar a espada quando se lhe diz uma palavra atravessada ou se lhe quer dizer um insulto, fique certo que isto não é honesto nem cristão. Pois somente a paixão e o amor à honra vã e imaginária fazem agir assim. Portanto, é contra a boa educação ser tão rápido em se defender de alguma injúria ou de algum ultrage; e as regras do Evangelho querem que se sofram as injúrias com paciência.
Jesus Cristo até mandou que São Pedro guardasse sua espada na bainha quando este quis usá-la para defender seu mestre.
Ao estar sentado deve-se colocar a espada a seu lado puxando o talabarte ou o cinturão o mais possível para trás de si. O mesmo se deve fazer quando se senta à mesa e tomar cuidado para que a espada esteja atrás de si ou entre as cadeiras de modo que não possa
incomodar ninguém; não é conveniente tirá-la nesta ocasião.
Quando alguém estiver obrigado a puxar a espada, não deve fazê-lo sem as luvas nem colocá-la sobre a cama com as luvas; isto seria uma grande falta de cortesia. Deve colocá-las num lugar próprio, fora da visão das pessoas que podem entrar no quarto ou com
quem se está.
Se acontece que uma pessoa de grande qualidade entra no local de alguém que tem o direito de levar a espada, deve recebê-la com as luvas na mão e a espada a seu lado. Quanto aos que não levam espada, tenham as luvas em mão e o manto sobre os dois ombros.
A boa educação quer algumas vezes que se use uma bengala, mas só a necessidade é que pode permitir ter uma bengala na mão.
Assenta mal levar uma baguete, ou bengala pequena em casa dos Grandes: mas lá pode-se ter em mãos uma bengala grossa em caso de enfermidade ou se tenha necessidade para se manter de pé ou para caminhar com mais facilidade.
É também muito descortês ficar brincando com uma baguete e usá-la para bater no chão ou os cascalhos para fazer saltar pedrinhas. Totalmente mal educado é erguê-la como se quisesse bater em alguém.
Nunca é permitido usar dela para tocar alguém com ela ainda que fosse por brinquedo.
Ao estar em pé a pessoa não se deve apoiar inconvenientemente sobre a bengala ou a baguete, como acontece algumas vezes com os agricultores.
Também não se
deve segurá-la firme contra o chão como se faria com um bastão, o que manifestaria uma certa dignidade ou alguma autoridade na pessoa. Mas convém manter a baguete suspensa no ar, de maneira educada e modesta ou deixá-la tocar no chão sem se
apoiar nela.
Ao caminhar, é contra a boa educação carregar uma bengala ou uma baguete debaixo do braço; e não o é menos arrastá-la com negligência no barro, e é ridículo apoiar-se nela de um modo que ressinta orgulho ou riqueza; e quando se faz gestos ou alguma
outra coisa, é muito descortês segurar uma bengala ou uma baguete na mão direita.
Quando se está sentado, não se deve usar uma baguete ou uma bengala para escrever na areia ou para desenhar figuras. Isto manifesta que se é um sonhador ou mal educado. Também não é bom colocar a bengala sobre as cadeiras, mas deve-se mantê-la diante de si de maneira decente.
Antes de sentar à mesa, nunca se deve colocar a baguete ou a bengala sobre a cama; isto é falta de cortesia, mas deve-se colocá-la num lugar fora do alcance da vista da gente. Se a pessoa usa um bastão, não o pode apoiar contra a parede. Sempre se deve deixar a baguete ou a bengala quando se depõe a espada e as
luvas.
São João Batista de La Salle (1651-1719)
São João Batista de La Salle (1651-1719)