MODÉSTIA dos cabelos

AS REGRAS DE CORTESIA
1 Parte-DA MODÉSTIA 


CAPÍTULO III

Dos cabelos

Não há ninguém que não deva tomar como regra e prática se pentear todos os dias e nunca se deve aparecer diante de quem quer que seja com os cabelos em desalinho e sujos. Tenha-se sempre cuidado de que não tenham vermina nem piolho. Esta precaução e este cuidado é muito importante ao se tratar de crianças.

Embora não se deva colocar facilmente pó nos cabelos e porque isto denota um homem efeminado, deve-se contudo ter o cuidado de não ter os cabelos gordurosos. Por isso, se eles o são naturalmente, pode se desengordurá-los com farelo, ou usar um pó no pente para os secar e retirar-lhes um pouco de sua umidade que poderia estragar a roupa e os trajes.

É muito descortês pentear-se em sociedade; mas é uma falta insuportável fazê-lo na igreja. Este é um lugar em que se deve estar limpo por respeito a Deus; mas o mesmo respeito leva a só entrar nela completamente limpo.

Se São Pedro e São Paulo proíbem às mulheres fazerem os cabelos, condenam com mais forte razão certos enfeites dos homens que, por terem naturalmente menos inclinação a esta sorte de vaidade

do que as mulheres, por conseguinte, devem ter muito mais desprezo por isto e ficar bem mais longe de se entregar a isso.

Como não é conveniente ter os cabelos curtos demais, porque isto desfiguraria a pessoa, deve-se também tomar cuidado para que não sejam longos demais, e particularmente que não caiam por cima dos olhos. Por isso é bom cortá-los devidamente de tempos

em tempos.

Há pessoas que para sua conveniência, quando sentem calor ou têm alguma coisa a fazer, colocam os cabelos atrás das orelhas ou debaixo do chapéu. Isto é muito descortês e sempre se deve deixar cair os cabelos naturalmente. Também é sinal de modéstia e de

honestidade não os tocar sem necessidade e o respeito que se deve ter para com os outros exige que não se coloquem as mãos no cabelo na presença deles.

Evite-se cuidadosamente passar várias vezes a palma da mão sobre a cabeça para comprimir os cabelos, para os estender ou os encaracolar de cada lado com os dedos, passar os dedos através deles para os pentear, ou para os sacudir de maneira inconveniente ao sacudir a cabeça. Todas estas maneiras, inventadas pela utilidade ou a grosseria e que a honestidade, a modéstia e o respeito para com o próximo não podem aturar.

Contra a cortesia é ainda mais ter uma peruca mal penteada do que o cabelo mal penteado. Por isso, os que a usam devem ter um cuidado todo particular de a ter limpa, pois o cabelo de que é composta não tem a alimentação em si mesmo, por isso precisa ser

penteado e ajustado com muito mais cuidado do que os cabelos naturais para se manterem limpos.

Uma peruca é muito mais acertada e conveniente para a pessoa que a usa quando é da cor do cabelo do que quando é castanha ou loira. Contudo há gente que a usa tão encrespada e tão loira descolorada

de maneira que mais parece mulher do que homem.

Se bem que não se deva negligenciar muito esta espécie de enfeites, quando são usados, é muito mais contrário à cortesia e à sabedoria de um homem, empregar muito tempo e ter muita preocupação para os tornar limpos e ajustados.

   São João Batista de La Salle (1651-1719)