1 Parte-DA MODÉSTIA
CAPÍTULO VII
Do nariz e da maneira de se assoar e espirrar
É descortês franzir o nariz e geralmente são os zombadores que assim fazem. Também é inconveniente e descortês remexê-lo, até nem se deve tocar nele com a mão nem com os dedos descobertos.
A cortesia requer que se mantenha o nariz bem limpo e seria sumamente vil enchê-lo de muco.
Portanto, é preciso limpá-lo muitas vezes para o manter asseado, porque o nariz é a honra e a beleza do rosto, e é a parte de nós mesmos que mais aparece.
É muito feio escavar incessantemente nas narinas com o dedo e ainda mais insuportável é levar à boca o que se tirou das narinas ou mesmo o dedo que se acaba de introduzir nelas. Isto é capaz de causar náuseas aos que o vêem.
Ignóbil é assoar-se com a mão nua passando-a por baixo do nariz, ou assoar-se com a manga ou na roupa; e é muito contrário à cortesia assoar-se com dois dedos e depois jogar o muco no chão e enxugar-se depois os dedos na roupa, porque todos sabem como
assenta mal ver
tais sujeiras na roupa que sempre deve estar muito limpa, por mais pobre que seja, porque são o ornamento de um servo de Deus e de um membro de Jesus Cristo.
Há alguns que colocam um dedo contra o nariz e depois sopram por ele e expelem ao chão a sujeita que havia dentro dele. Os que fazem isso são pessoas que não sabem o que é a cortesia.
Sempre se deve usar o lenço para se assoar e nunca outra coisa; e, ao fazê-lo, deve-se cobrir ordinariamente o rosto com o chapéu ou pelo menos, quando se está com poucas pessoas e que se possa
facilmente virar o rosto da frente dos outros, deve-se fazê-lo e assoar-se fora da presença do grupo.
Ao se assoar, deve-se evitar o barulho com o nariz, soprar forte demais com as narinas e roncar, pois isto é de muito mau gosto.
Quando se está à mesa, convém cobrir-se com o guardanapo e esconder o rosto quanto se pode, pois não é cortês assoar-se abertamente.
Antes de se assoar, é descortês puxar por muito tempo o lenço e é uma falta de respeito às pessoas com quem se esta, desdobrá-lo em diversos lados para ver qual é o lado em que se vai assoar. Deve-se puxar do bolso o lenço e assoar-se rapidamente e de modo que
quase não seja percebido pelos outros.
Depois que a pessoa se assoou, é preciso não ficar olhando no lenço, mas deve dobrá-lo imediatamente e recolocá-lo no bolso.
Não é cortês ficar com o lenço na mão, oferecê-lo a alguém seja
para o que for, mesmo se fosse perfeitamente branco. Contudo, se alguma pessoa o pedir e insistir em que o dê, então o pode dar.
Quando alguém está a ponto de espirrar, não deve impedi-lo, mas é de cortesia desviar um pouco o rosto para o lado e cobri-lo com o lenço e depois espirrar o mais calmamente e com o menor ruído
possível. Em seguida deve-se agradecer gentilmente aos presentes que o tiverem saudado por meio de uma reverência.
Quando alguém espirra não se deve dizer em voz alta: Deus te abençoe ou Saude. Somente, sem dizer uma palavra, se deve descobrir-se e fazer a reverência e a fazer bem profunda dobrando-se bem baixo caso se trate de uma pessoa a quem se deve
muito respeito.
Uma prática muito em voga é tomar rapé; mas é muito melhor não o tomar, especialmente quando se está em sociedade e nunca se deve tomá-lo quando se está com pessoas a quem se deve respeito. Mas é muito descortês mastigá-lo introduzi-lo nas narinas. Não é
menos inconveniente fumar cachimbo, é insuportável fumar na presença de mulheres.
Se uma pessoa qualificada toma rapé diante das que estão com ela e lhes apresenta o mesmo, o respeito que lhe devem as impede de o recusar, e se tiverem alguma repugnância para o tomar pelo nariz, basta que façam de conta que o tomam.
Se o costume de tomar rapé pode ser permitido aos homens,
porque seu uso é muito espalhado, ele não deve acontecer para as mulheres, e é absolutamente contra a cortesia que elas o tomem.
Também é indecoroso que os que o tomam terem sempre um lenço à mão e vê-lo cheio de sujeira e de fumo, o que aliás não pode deixar de acontecer aos que tomam muitas vezes rapé pelo nariz.
Quando se toma rapé em sociedade, é preciso que seja raro e que não se tenha sempre a tabaqueira nas mãos, nem as mãos cheias de fumo. Deve-se também cuidar para que não caia um pouco de rapé na roupa, porque é muito descortês que se possa ver tal coisa. E para que isto não aconteça deve-se tomar só um pouco cada vez.
São João Batista de La Salle (1651-1719)
São João Batista de La Salle (1651-1719)