A Imitação de Cristo - III. DA CONSOLAÇÃO INTERIOR- Capitulo 30
30. Como se há de pedir o auxílio divino e confiar para recuperar a graça
- JESUS: Filho, eu sou o Senhor, que te conforta no dia da
tribulação (Na 1,7). Vem a mim quando te achares aflito. O que mais
te impede de receber a consolação é que tarde recorres à oração. Antes
que ores com atenção, procuras consolar-te, recreando-te com vários
divertimentos exteriores. Daqui vem que pouco proveito tiras de tudo,
até que conheças que sou eu quem salva do perigo os que em mim esperam,
e que fora de mim não há auxílio valioso, nem conselho útil, nem remédio
durável. Uma vez, porém, que recobraste alento depois da tempestade,
procura readquirir forças à luz das minhas misericórdias; pois estou
perto, diz o Senhor, para tudo restaurar, não só com integridade,
mas também com abundância e profusão.
- Porventura há para mim alguma coisa dificultosa (Jer 32,37), ou sou
semelhante àquelas que dizem e não fazem? Onde está a tua fé? Tem
firmeza e segurança! Mostra-te corajoso e magnânimo, e a seu tempo
te virá a consolação. Espera por mim, espera! Virei e te curarei.
É tentação o que te atormenta, é temor vão o que te assusta. Que ganhas
com a solicitude de um futuro contingente, senão que tenhas tristeza
sobre tristeza? A cada dia basta seu fardo (Mt 6,34). Coisa vã e inútil
é entristecer-se ou regozijar-se com as coisas futuras, que talvez
nunca venham a realizar-se.
- É próprio do homem deixar-se iludir por tais imaginações, mas é sinal
de pouco ânimo ceder tão facilmente às sugestões do inimigo. A ele
pouco importa se é por meios verdadeiros ou falsos que te seduz e
engana, se é com amor dos bens presentes, ou com o temor dos males
futuros que te deita a perder. "Não se perturbe, pois, teu
coração, nem se amedronte" (Jo 14,27). Crê em mim, e tem
confiança em minha misericórdia. Quando te julgas muito longe de mim,
mais perto estou, às vezes, de ti. Quando pensas que está tudo quase
perdido, muitas vezes está próxima a ocasião de granjeares maior merecimento.
Nem tudo está perdido, por te acontecer alguma contrariedade. Não
julgues pela impressão do momento, nem te aflijas com qualquer tribulação,
venha donde vier, como se não houvesse esperança de remédio.
- Não te julgues inteiramente desamparado, ainda quando, de tempos a
tempos, te mando alguma tribulação ou te privo de alguma consolação
desejada; porque é este o caminho por onde se vai ao reino dos céus.
E isto, sem dúvida, convém mais a ti e a todos os meus servos, serdes
exercitados nas adversidades, do que se tudo vos sucedesse à vossa
vontade. Eu conheço os pensamentos escondidos, e sei que muito importa
à tua salvação seres, às vezes, privado de toda consolação espiritual,
para que não te exalte o bom progresso e te desvaneças do que não
és. O que dei posso tirar, e dar de novo, quando me aprouver.
- É sempre meu o que dou, e quando o tiro; não tomo coisa tua, pois
"de mim procede qualquer dádiva boa de todo dom perfeito"
(Tg 1,17). Se eu te enviar qualquer pena ou contrariedade, não te
revoltes nem desfaleça teu coração; eu posso num momento aliviar-te
e transformar tua mágoa em alegria. Todavia, procedendo eu assim para
contigo, sou justo e digno de louvor.
- Se refletires bem e julgares as coisas segundo a verdade, não deves
afligir-te tanto com a adversidade, nem desanimar, mas, ao contrário,
alegrar-te e dar-me graças. Até deve ser tua única alegria que eu
te aflija com dores, sem poupar-te. Assim como meu Pai me amou, também
eu vos amo a vós (Jo 15,19), disse eu a meus diletos discípulos, e,
entretanto, não os enviei às delícias temporais, mas às grandes pelejas,
não às honras, mas aos desprezos, não aos passatempos, mas sim a produzir
fruto copioso na paciência. Meu filho, lembra-te bem destas palavras.