A Imitação de Cristo - III. DA CONSOLAÇÃO INTERIOR- Capitulo 37
37. Da pura e completa renúncia de si mesmo para obter liberdade de coração
- JESUS: Filho, deixa-te a ti, e achar-me-ás a mim. Despe tua
vontade e teu amor-próprio, e sempre tirarás lucro. Porque, logo que
te entregares a mim sem reservas, se te acrescentará a graça.
- A ALMA: Senhor, em que devo renunciar-me, e quantas vezes?
- JESUS: Sempre e a toda hora tanto no muito como no pouco.
Nada excetuo, mas quero te achar despojado de tudo. De outra sorte,
como poderás ser meu e eu teu, se não estiveres, exterior e interiormente,
desapegado de toda vontade própria? Quanto mais prontamente isso fizeres,
tanto melhor te acharás, e quanto mais pleno e sincero for teu sacrifício,
tanto mais me agradarás e maior lucro terás.
- Alguns há que se entregam a mim, mas com alguma reserva, porque não
têm plena confiança em Deus, e por isso tratam de prover as próprias
necessidades. Outros, a princípio, tudo oferecem, mas depois, combatidos
pela tentação, volvem-se novamente às próprias comodidades, e eis
por que quase não progridem nas virtudes. Estes nunca chegarão à verdadeira
liberdade do coração puro, nem à graça de minha doce familiaridade,
enquanto não renunciarem de todo a si mesmos, oferecendo-se em cotidiano
sacrifício a Deus, sem o que não há nem pode haver união deliciosa
comigo.
- Muitas vezes te disse e agora te torno a dizer: deixa-te, renuncia
a ti mesmo, e gozarás grande paz interior. Dá tudo por tudo, não busques,
não reclames coisa alguma, persevera, pura e simplesmente, em mim,
e me possuirás. Terás livre o coração e as trevas não te poderão oprimir.
A isto te aplica, isto pede, isto deseja: ser despojado de todo amorpróprio,
para que possas seguir nu a Jesus desnudado, morrer a ti mesmo e viver
eternamente. Então se dissiparão todas as vãs imaginações, penosas
pertubações e supérfluos cuidados. Logo também desaparecerá o temor
demasiado, e morrerá o amor desordenado.